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sexta-feira, 18 de maio de 2012

Artigos: Cultura e Futebol



Garotos com nome de jogador de futebol, adultos apaixonados por álbuns de figurinhas sobre o assunto, filmes e livros que relembram trajetórias demitos do esporte mundial. Até que ponto vai a inter-relação entre as atividades esportivas e a cultura de uma nação? Como o futebol é capaz de interferir na formação social e intelectual no Brasil?

As histórias do vendedor André Augusto de Almeida, de 32 anos, e do publicitário Felipe Bores, de 26, ilustram bem esta febre. Estes "marmanjos" são verdadeiros fanáticos pelo futebol e expressam esta paixão de uma maneira inusitada. Eles são colecionadores de camisas de futebol. Juntos, possuem cerca de 600 exemplares. "O que me motiva a cada dia é comprar novos itens, é a vontade de ter uma coisa que eu não vou ver mais ninguém usando", afirma Almeida.

O casamento também faz uma tabela na música. Júnior, ex-jogador do Flamengo e agora comentarista de TV, tentou transferir o sucesso do gramado para o timbre nos microfones. Em 1982, antes da Copa do Mundo da Espanha, ele gravou "Voa Canarinho", que embalou o futebol-arte da época. "Todo jogador gostaria de ser um pouco cantor, e todo cantor gostaria de ser um pouco jogador de futebol", diz Júnior.

Bem entrosado, o assunto não poderia faltar à literatura. A produção deobras com enfoque no esporte surgiu em larga escala a partir do fim da década de 1990. Bom exemplo disso é o livro "Estrela Solitária: um Brasileiro Chamado Garrincha", de Ruy Castro, que conta a trajetória vitoriosa da carreira de Garrincha, uma lenda do futebol brasileiro, e seus deslizes.

Depois do boom da Internet, os blogs se tornaram uma ferramenta agradável para qualquer pessoa criticar, elogiar, sugerir, opinar sobre os mais diversos assuntos. Para José Maria de Aquino, jornalista e blogueiro, a tendência é o internauta peneirar os links de acordo com a qualidade.

Estas manifestações culturais demonstram o quanto o esporte está embutido no dia-a-dia das pessoas, desde os gestos mais simples. Seja em filmes, músicas, coleções, livros ou blogs, o esporte (e principalmente o futebol) ganha terreno na formação social do brasileiro e influencia a cultura de todo o país.



A seleção brasileira foi pentacampeã do mundo com um lateral-esquerdo chamado Roberto Carlos. No Vasco campeão da Libertadores em 1998, o zagueiro central tinha nome de música do Rei da Jovem Guarda Odvan. O artilheiro do Vitória na virada de século foi batizado com grife de galã de cinema: Allan Delon. Outro artilheiro com passagem por vários clubes tem nome e sobrenome de banda: Creedence Cleawater Couto, hoje no Madureira.

No dia-a-dia dos clubes e da seleção, não faltam exemplos relacionando o futebol ao cinema e à música. Esse fenômeno não é apenas brasileiro. Em qualquer país apaixonado por futebol, os dribles e os craques não fascinam apenas torcedores, mas também diretores de cinema, compositores, cantores e atores. Todos aproveitam a popularidade do esporte para conquistar espectadores e vender álbuns.

A maior mostra dessa intensa relação do futebol com o cinema e a música é a trajetória de Pelé, o maior jogador de todos os tempos. Além de conquistar três Copas do Mundo e dois mundiais interclubes com o Santos, o atleta do século participou de nada mais nada menos do que dez filmes e ainda gravou e compôs músicas ao lado de monstros sagrados como Roberto Carlos e Elis Regina.

Pelé estreou no cinema quando tinha ainda 22 anos, ao estrear, junto com diversos companheiros do Santos, o filme Rei Pelé. Nas quatro décadas seguinte, ele estrelou desde documentários sobre sua carreira, como o recente Pelé Eterno, a aventuras curiosas, como em Fuga para a Vitória, de 1981. Neste filme de John Huston, ambientado na Segunda Guerra Mundial, Pelé e um grupo de prisioneiros ingleses desafia um time de oficiais nazistas.

Em jogo, estava a liberdade dos jogadores. Com passe do inglês Bobby Moore, campeão do mundo em 1966, Pelé marca de bicicleta o gol da vitória. Mais decisivo que ele, só o goleiro do time, Sylvester Stallone ele mesmo. A estrela de Rambo e Rocky defende um pênalti aos 45 minutos do segundo tempo e garante a vitória.

Ao gravar Os Trapalhões e o Rei do Futebol, em 1989, Pelé chegou a afirmar que, quando criança, havia sonhado em ser ator. Em outras oportunidades, ele também declarou que gosta, na verdade, é de música.O craque já sofreu de amores em dueto com Elis Regina, na música Perdão não tem, em que cantava, com voz apaixonada: não vá embora, porque a saudade vai ficar em seu lugar. Mais recentemente, em parceria com Paulo Renato de Souza, o Rei virou hit com ABC. Quem não se lembra de que toda criança tem que ler e escrever?

Além de Pelé, jogadores como Júnior, Maradona e Serginho Chulapa já brincaram de cantor e ator. No time dos artistas apaixonados por futebol, há Jorge Ben, Chico Buarque, SimoninhaWalter Salles, Ugo Giorgetti. Sobram exemplos para mostrar que o esporte tem tudo a ver com música e cinema.



Kaká e David Beckham são apenas alguns do exemplos que podem ser citados quando o assunto é moda no futebol. Usados por diversas marcas como garotos-propaganda, os jogadores vêm dando ao futebol um outro lado que nunca foi muito explorado.

O meia-atacante do Milan, por exemplo, é o modelo usado em comerciais pela Giorgio Armani. O inglês é outro que faz sucesso entre os departamentos de marketing das marcas. Já é comum vê-lo em peças publicitárias de grifes famosas pelo mundo.

Basta lembrar que o jogador do LA Galaxy tem, na lista elaborada pela revista "France Football", que leva em conta todas as verbas arrecadas pelo jogador, uma verba acumulada de R$ 83,4 milhões no ano passado. Deste total, apenas R$ 12,1 milhões vêm de salários. O resto Beckham fatura com marketing e outras verbas minoritárias.

A tendência ultrapassa o universo dos jogadores. Criadas apenas para uniformizar um time, as camisas de futebol vêm ganhando outras funções nos últimos tempos.

Hoje, as peças viraram também artigos de moda e servem, inclusive, para serem usadas na noite, em festas e em um simples passeio de shopping.

Engana-se, porém, quem acha que a nova moda dá preferência às camisas atuais. Os adeptos dessa mania costumam sair às ruas com as chamadas peças retrô, com um visual antigo e material diferenciado.

O estilista João Pimenta indica o alto índice de publicidade nas atuais vestimentas como a principal causa para esse tipo de prioridade.

"As camisas de hoje mais parecem um outdoor. Elas têm anúncio em todos os lugares. Na manga, nas costas, sem contar os calções. Até pizzaria a gente vê nos uniformes", explica Pimenta.

Esse também é o motivo pelo qual o publicitário Felipe Bores, 26, aderiu à moda das retrôs. O que no início era apenas uma vontade de criança acabou virando uma febre. Atualmente, ele ostenta a marca de ter todas as camisas lançadas pela maior loja brasileira de materiais que revivem o passado do esporte, a Liga Retrô: são cerca de 70 modelos, que variam entre R$ 90 e R$ 110. Ao todo, contando também as atuais, o número ultrapassa os 400.

"Tudo começou com uma do Milan. A partir dali, resolvi entrar na onda e isso dura até hoje. Qualquer um que me fala o que quero de presente a resposta é a mesma: camisa de futebol", brinca Bores.

"Hoje, compro mais camisas retrôs pelo material diferenciado, pelo design e por não ter patrocinadores estampados. O preço nem tive coragem de calcular, mas, com certeza, valeu a pena cada centavo investido", conclui.



Cada um com a sua mania, já dizia o ditado popular. A do estudante de direito Eduardo Trigo, de 20 anos, do vendedor André Augusto de Almeida, de 32 anos, e do publicitário Felipe Bores, de 26 anos, é colecionar camisas de futebol. Juntos, eles somam quase 600 exemplares, sempre jurando que cada uma é diferente da outra.

"Tudo começou quando eu era criança, com uma camisa do Botafogo. Hoje, gosto das mais raras e daquelas que foram usadas em jogo, que ninguém tem", explica Eduardo.

"O que me motiva a cada dia mais é comprar novos itens, é a vontade de ter uma coisa que eu não vou ver mais ninguém usando", concorda o vendedor André.

Unidos pelo mesmo motivo e pelas mesmas vontades, os três têm também uma grande diferença entre eles. Trigo, por exemplo, soma 56 camisas e é o que apresentamenos exemplares. Almeida, por sua vez, tem 130 camisas, o que representa uma boa marca, mas muito atrás de Bores, que acumula incríveis 414 camisas.

Apesar de ficar na última colocação no que se refere à quantidade, Trigo tem um diferencial que nenhum deles possui. Para unira classe que ele chama de colecionadores de camisa, o fluminense criou o fórum Coleção Futebol, que tem por objetivo unir todos aqueles que gostam da mesma mania. Lá, são feitas trocas, vendas e compras de novos itens para a coleção dos que aderiram à febre.

Almeida também é integrante do fórum, mas sua grande diferença em relação aos outros é a variedade de suas camisas. Na sua coleção, é possível encontrar até um exemplar usado por Edílson Pereira de Carvalho, o famoso árbitro da Máfia do Apito de 2005, e outro usado por Rivellino na Copa do Mundo.

Também é de camisa antigas que Bores mais gosta. Ele, porém, não se contenta em apenas guardar os exemplares mais velhos. O publicitário ostenta a marca de ter todas as quase 70 camisas lançadas pela Liga Retrô, a maior distribuidora de materiais que revivem o passado do esporte.

Juntos, eles têm o mesmo método para conservar seus itens: guardam em um cômodo dedicado só para elas e não deixam ninguém mexer nas coleções.

Mas a carreira de um colecionador não é só de alegrias. Cada um tem sua história de tragédia com um de seus bens.

"Moro em uma casa com seis cachorros. Certa vez, um deles pegou minha camisa em um varal e rasgou inteira. Depois, minha mãe acabou me dando uma nova, mas não é a mesma coisa", lamenta Trigo.

"Em 2007, estava viajando, e uma das minhas malas foi extraviada. Desesperado ao embarcar, nem pensei duas vezes e já comprei dois exemplares que estavam dentro da minha mala. Só depois pensei em ligar para a companhia aérea, que conseguiu recuperar minha bagagem", lembra Bores.

Nenhum deles revelou quanto gastou com a coleção, mas concordam que valeu a pena. Tanto que Bores e Trigo não pensam em vender as camisas para arrecadar fundos. Almeida admite comercializar, mas apenas para concentrar sua coleção em camisas vascaínas, seu time do coração.



A perda do título mundial de 1950, com o Maracanã lotado, para o Uruguai, foi o primeiro sintoma de que a sociedade brasileira se apaixonaria pelo esporte mais popular do planeta. Ao mesmo tempo, aquela década representou a construção da indústria brasileira, principalmente sob o governo de Juscelino Kubitschek, e o nascimento dos problemas comuns de países em desenvolvimento, como a violência, a criminalidade e o inchaço das cidades.

No final da primeira década do século XXI, o silêncio do Maracanã de 1950 fez o futebol ecoar no Brasil nos últimos¿60 anos. Neste meio tempo, a liberdade de expressão superou obstáculos e se instalou na maioria dos países. Hoje, qualquer evento esportivo, por menor que seja, ganha destaque na mídia mundial, seja por meio de livros, filmes, notícias ou blogs. Mas, afinal, qual a relação entre a mídia (eletrônica ou não), futebol e a sociedade atual? Como um livro ou uma página na internet influenciam na formação cultural e social do brasileiro?

Do Maracanazzo à opinião eletrônica
Cinqüenta e oito anos depois do Maracanazzo, os dribles, a ginga e a alegria do futebol brasileiro conquistaram cinco títulos mundiais, alguns continentais, outros de clubes e, sobretudo, o mundo. Esta paixão, aliada às impressões em série, a globalização e a mídia eletrônica, permitiu o surgimento das mais variadas manifestações políticas, de carinho, estudos e opiniões sobre o que um jogador é capaz de fazer com a bola. Hoje, tanto uma obra literária como uma página na internet podem ter o mesmo peso de penetração social e ser capaz de influenciar na formação cultural de um indivíduo.

A explosão da quantidade de blogs (ou sites pessoais) é prova disso. O jornalista e blogueiro esportivo José Maria de Aquino, da Rede Brasileira de Televisão (RBT) e do Terra TV, reafirma o avanço dos meios digitais e concorda que a grande rede impulsionou as manifestações pessoais. "A internet é uma ferramenta que permite uma interação jamais vista. De um modo geral, os blogs são uma abertura muito grande, o que gera muita bobagem na rede. Por isso, acredito que depois deste boom a tendência é o enxugamento. O internauta vai buscar qualidade no que interessa", afirma.

Mas a discussão do esporte, sobretudo o futebol, não se limitou à internet e avançou pela literatura na década de 1990. Para explicar a relação entre cultura e futebol, José Miguel Wisnik escreveu "Veneno Remédio - O Futebol e o Brasil". A obra faz um paralelo entre a composição da sociedade brasileira, com todos seus problemas crônicos (violência, saúde, educação, criminalidade, habitação), e sua função analgésica ou atuante que o futebol emprega no país. Em entrevista ao programa "Roda Viva", da TV Cultura, o autor revelou que o futebol é, ao mesmo tempo, um veneno e um remédio para o brasileiro.

Veneno porque pode ser a aposta para mudar de vida, fazer carreira e ascender socialmente e, de repente, tudo isso vai por água abaixo. Remédio porque isso tudo pode dar certo e se tornar um viés para amenizar as mazelas sociais do país. Para ilustrar a situação, Wisnik recorre ao¿escritor¿Pasolini, que faz um raciocínio envolvendo prosa, poesia e futebol.

O futebol prosa é aquele que utiliza passes triangulados, ocupa bem os espaços, possui raciocínio rápido, objetivo e no qual o gol sai maquinamente. Já o futebol poesia é o brasileiro, que segue caminhos tortuosos, não tem uma lógica, é repleto de dribles, gingas, chapéus, firulas, criações inesperadas. "É o futebol onde se inventam os gols", explica.

Esta reinvenção se reflete na sociedade brasileira. A malandragem, os altos e baixos, a falta de planejamento, os resultados inesperados, coexistem tanto no esporte como no cotidiano nacional. "Não gosto de ter uma visão trágica do futuro do Brasil. Temos que apreciar as maravilhas e os horrores brasileiros com os mesmos olhos. Acredito que a originalidade e singularidade do futebol se traduzem na formação social do Brasil", compara Wisnik.

Ainda com a função de promover a democracia, o futebol permite a ascensão social dos excluídos, segregados e pobres do começo do século XX, e apoiado nisso se tornou uma forma de expressão artística. Garrincha¿comprova isso. Acostumado ao drible em campo e ao álcool fora dele, o jogador das pernas tortas conseguiu se tornar um mártir até mesmo para quem não o conheceu. "Eu costumo comparar o Garrincha ao Macunaíma. Adorava brincar em campo, fazer a alegria do povo, mas é um reflexo da sociedade brasileira", diz Wisnik.

As peripécias de Garrincha dentro e fora dos campos renderam uma vasta bibliografia sobre o jogador. Em "Estrela Solitária: um Brasileiro Chamado Garrincha", Ruy Castro apresenta ao mundo o mito e o lado obscuro da carreira do ex-botafoguense e seleção.

Para José Maria de Aquino, a obra sobre o ex-botafoguense é um bom exemplo da literatura esportiva de qualidade. "As biografias não autorizadas geralmente são mais férteis. O livro sobre Garrincha explora suas dificuldades com o alcoolismo, contada por uma pessoa isenta e fora do dia-a-dia do atleta [Ruy Castro]. É o que ocorre também no livro sobre o Telê. Acho que as obras escritas pelos próprios jogadores ou em parceria com jornalistas não alcançam o mesmo sucesso", afirma.

Aquino coloca a falta de estudo como principal fator para a superficialidade. "Antigamente, o futebol não era profissão nem envolvia tanto dinheiro. Então o jogador era médico, advogado, professor. É o caso do Sócrates. Hoje, há técnicos e jogadores que vestem roupas de marca, mas não possuem nenhuma instrução", opina.

Para José Miguel Wisnik, a capitalização do esporte não prejudica o espetáculo. Pelo contrário, só o incentiva. "Há algo no futebol que não se rende ao dinheiro, porque mesmo os times galáticos fracassam", conta.¿

O autor classifica a surpresa e o inesperado como a alma do jogar bola. Este seria o motivo pelo qual o futebol se adaptou tão bem à Europa e na América do Sul, e não criou raízes nos Estados Unidos. "Para os americanos, o futebol não faz sentido porque nem sempre contabiliza pontos como o basquete, o golfe, o futebol americano. O futebol é o único esporte não linear, que permite um ótimo espetáculo mesmo com um resultado de 0 a 0", reflete Wisnik.

Aquela final contra o Uruguai em 1950 foi o marco para o futebol ganhar força no conteúdo das publicações escritas, faladas ou eletrônicas no Brasil. Desde então, esta expressão se disseminou de tal maneira que tanto uma obra literária como um blog podem ter o mesmo grau de penetração social, embora com públicos distintos (nem sempre o internauta que visita blogs e sites é o mesmo apaixonado por literatura, e vice-versa). A presença maciça nas prateleiras ou nos endereços eletrônicos ilustra o nível de importância que o assunto tomou no país do futebol.